O Voando em Moçambique é um pequeno tributo à História da Aviação em Moçambique. Grande parte dos seus arquivos desapareceram ou foram destruídos e o que deles resta, permanecem porventura silenciosos nas estantes de muitos dos seus protagonistas. A História é feita por todos aqueles que nela participaram. É a esses que aqui lançamos o nosso apelo, para que nos deixem o seu contributo real, pois de certo possuirão um espólio importante, para que a História dessa Aviação se não perca nos tempos e com ela todos os seus “heróis”. As gerações futuras de certo lhes agradecerão. Muitos desses verdadeiros heróis, ilustres aventureiros desconhecidos, souberam desafiar os perigos de toda a ordem, transportando pessoas e bens de primeira necessidade ou evacuando doentes, em condições meteorológicas adversas, quais “gloriosos malucos das máquinas voadoras”. Há que incentivar todos aqueles que ainda possuam dados e documentos que possam contribuir para que essa História se faça e se não extinga com eles, que os publiquem, ou que os cedam a organizações que para isso estejam vocacionadas. A nossa gratidão a todos aqueles que ao longo dos tempos se atreveram e tiveram a coragem de escrever as suas “estórias” e memórias sobre a sua aviação. Só assim a História da Aviação em Moçambique se fará verdadeiramente, pois nenhum trabalho deste género é suficientemente exaustivo e completo. A todos esses ilustres personagens do nosso passado recente que contra tudo e todos lutaram para que essa história se fizesse, a nossa humilde e sincera homenagem.

A eles dedicamos estas linhas.

José Vilhena e Maria Luísa Hingá

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Quem tiver fotos e/ou documentos sobre a Aviação em Moçambique e os queira ver publicados neste blogue, pode contactar-me pelo e-mail:lhinga@gmail.com

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24/09/06

16 - Início da Aviação em Moçambique

O entusiasmo pela aviação em Moçambique já vinha de longe e pode dizer-se mesmo que esta Província acompanhou o pioneirismo dos tempos gloriosos da aeronáutica.

O primeiro aviador Moçambicano de quem temos notícia e cujo nome anda tão esquecido nas páginas da história da aviação Portuguesa foi Abeillard Gomes da Silva, da Beira, funcionário aduaneiro da Companhia de Moçambique.
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O aeroplano "Gomes da Silva II", inventado por Abeillard Gomes da Silva, foi um dos pioneiros da aviação em Moçambique.

"Gomes da Silva II"
Foto retocada e colorida cedida pelo blog Delagoa Bay

ABEILLARD GOMES DA SILVA
Estudioso e inteligente, fez em 1906 uma penosa viagem de travessia do vasto território de Manica e Sofala, administrado então por aquela Companhia majestática, e dessa viagem deixou pormenorizado relato na Revista de Manica e Sofala que despertou, ao tempo, enorme interesse.
Quando na Europa começava a falar-se em aeroplanos e em Portugal a aeronáutica era ainda um sonho, Gomes da Silva idealizou na Beira, muito em segredo, um aeroplano da sua invenção. Em Julho de 1909, tendo isso em mente, dirigiu-se a Lisboa e daí seguiu para Londres, onde, tomando, conhecimento com a ciência aeronáutica do tempo, se deslocou a Paris.
Com mil ignorados esforços e sacrifícios, construiu o que a revista de Manica e Sofala, de Dezembro de 1909, chamava de "Primeiro Aparelho de Aviação que havia de mostrar ao Mundo Científico e desportivo que Portugal, como todas as grandes Nações do Globo, também se interessava na gloriosa cruzada do Século XX e da conquista do vasto império dos ares".
O aeroplano de Gomes da Silva era "diferente de todos então existentes", e com ele fez o corajoso pioneiro, de 18 a 22 de Outubro de 1909, as primeiras experiências em Paris, no campo de manobras de Issy-Moulineux. E segundo a revista" as experiências foram coroadas do mais animador êxito, pois confirmaram, à evidência, a sua incontestável superioridade no que respeita à estabilidade, rapidez e segurança da marcha".
Parece que os organizadores do concurso em que Gomes da Silva queria apresentar-se com o seu aeroplano em Paris, teriam visto nele um perigoso concorrente, e assim eliminaram-no simplesmente do concurso por um "atraso de 21 dias na entrega do motor".
Desiludido voltou a Lisboa, e em Tancos, na escola Pratica de Engenharia, por concessão especial do Ministro de Guerra, introduziu modificações no seu aeroplano a fim de torna-lo mais perfeito.
Ali, com seu frágil aparelho, ensaia um voo. Um desastre põe termo aos seus sonhos altos e a sua vida se transforma, depois, acabando pobre, desiludido e esquecido.
Abeillard Gomes da Silva, regressou à Beira, onde retomou as suas funções de tesoureiro da Alfândega, falecendo naquela cidade no ano de 1930. Com ele trouxera acondicionado em caixotes o "Gomes da Silva II", cujo motor foi vendido na Beira
Em fins dos anos de 1960, numa louvável iniciativa, Santos Martins escrevendo para a "Pagina da Beira" do Jornal Notícias, de Lourenço Marques sugeriu que para um dos aeródromos sem nome da Província de Moçambique fosse dado o nome do pioneiro da aviação, Abeillard Gomes da Silva.
A MANUEL PINHO, infatigável investigador da história da Beira se ficou devendo o mérito de uma investigação séria sobre a vida e a acção de Gomes da Silva publicada nas colunas do Jornal Notícias, em diversos artigos.

Em 1911, o pioneiro Sul-Africano John Weston, que também se dedicara a experiências no seu país, com um aparelho da sua invenção, fez evoluções sobre Lourenço Marques, perante uma multidão entusiasmada e desceu em terrenos da Machava, de onde depois iniciou o voo de regresso aos seu país. Conquistou com o seu arrojo a alma popular.

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O Pioneiro Sul-Africano John Weston, em 1911, com o aparelho que fez evoluções sobre Lourenço Marques.
Foi, porém em Julho de 1917, que embarcou para Moçambique, afim de tomar parte na guerra contra os alemães a primeira unidade organizada de Aviação Portuguesa - a Esquadrilha Expedicionária a Moçambique da qual faziam parte os capitães Moura, Aragão e o alferes Jorge Gorgulho. A iniciativa partiu do Governador-Geral Dr. Álvaro de Castro, que como comandante das Forças Portuguesas em operações no Niassa requisitou ao Ministério das Colónias uma esquadrilha de aviação para cooperar com as nossas tropas em campanha. Foi encarregado da organização dessa esquadrilha o glorioso aviador Sacadura Cabral.
A realização, no dia 7 de Setembro de 1917, de um voo em Mocímboa da Praia, levado a cabo pelo alferes Jorge de Sousa Gorgulho, foi acontecimento histórico de grande relevo mas de trágicas consequências. O Avião, um " Farman F41" equipado com motor "Renault", caiu e incendiou-se, sofrendo o alferes Gorgulho graves queimaduras do que veio a falecer.
Jorge Gorgulho, foi, assim, o primeiro mártir da aviação portuguesa em Moçambique. O avião desmantelado, veio depois para Lourenço Marques, mas a coragem desse homem ficou legendaria nas páginas da nossa história.
Os começos da aviação organizada em Moçambique datam, portanto, propriamente de 1917, ano em que as autoridades militares receberam um avião de dois lugares.

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O Campo de aviação, na Carreira de tiro
Terminada a Guerra Mundial, em 2 de Dezembro, os aviões militares que operavam no Niassa, vieram para Lourenço Marques, e escolheu-se o alto da Matola para seu estacionamento, onde se construiu o campo e se montaram os hangares e mais dependências. Criara-se a unidade militar com a designação de Esquadrilha de aviação, e era comandante o Capitão - Aviador João Luís de Moura.
Esta unidade foi extinta em 30 de Junho de 1921, pelo Alto-comissário, Dr. Brito Camacho.
A primeira viagem aérea de Lisboa a Lourenço Marques fez-se de 5 de Outubro a 26 de Outubro de 1928 e foi um acontecimento de extraordinária relevância, que entusiasmou até ao delírio os Moçambicanos. A ideia de ligar pelo ar a Metrópole com a Província de Moçambique partiu do Capitão Pais de Ramos e do tenente Esteves. Tomaram parte nesse "raid" aéreo o Capitão Pais de Ramos e Oliveira Viegas, o Tenente João Maria Esteves e o primeiro Sargento-ajudante mecânico Manuel António. Foi um feito que impôs a aviação e os aviadores à admiração pública.
Ligaram Lisboa - Guiné - S. Tomé - Angola - Moçambique, por via aérea, chegando a Lourenço Marques a 25 de Outubro, aterrando em 34 pistas diferentes e totalizando 15 134 quilómetros de voo.
O êxito entusiasmou o major Alfredo Sintra quem em companhia do Capitão Avelino de Andrade, em 1930, partindo de Lourenço Marques alcançaram Luanda, realizando, assim, a primeira "Travessia de África" em avião.
De 1 de Abril a 14 de Maio de 1933, Moçambique inteiro vibrou de entusiasmo com o voo Lourenço Marques/ Lisboa realizado com êxito pelos pilotos civis Torre do Vale e Amadeu de Araújo. Era como que uma viagem de retribuição do "raid" empreendido, em 1928, pelo Capitão Pais de Ramos e seus companheiros, que haviam trazido a Moçambique o abraço da Pátria distante.

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"Torre do Vale foi um dos fundadores do Aero Clube de Moçambique.
Foi conhecido como o "Pai da aviação Civil Moçambicana". Na verdade, foi ele, juntamente com Manuel Maria Rocha (um dos pioneiros da aviação civil e comercial desta Província Ultramarina) que em Vila de João Belo, fizeram dessa hoje cidade, o berço da aviação civil, nesta província fundaram a Aero Colonial, Lda., a primeira companhia de aviação comercial de Moçambique, utilizando um avião "Waco", de 4 lugares. Depois de extinta aquela companhia, transitou Manuel Maria da Rocha para a DETA, que acabara de nascer, e da qual foi o primeiro piloto - aviador a servi-la. O piloto - aviador Torre do Vale, em 1933, fez a viagem aérea (raide) ligando Moçambique a Portugal, O seu itinerário foi: João belo / Lourenço Marques / Blantyre / Nbeia / Nairobi / Juba / Malakal / Wadi Halfa / Cairo / Bengazi / Gabis / Fez / Tanger / Lisboa (Alverca) / Madrid / Paris / Londres. O avião foi o "Gaza-III" mono motor, " Puss – Moth ", de 110 HP, com dois lugares.
Teve como companheiro de viagem o aluno piloto - aviador do Aero Clube de Moçambique: Amadeu de Araújo, já falecido. Torre do Vale morreu em Moçambique, numa caçada ao elefante
" Rui A. F. Castel -Branco no jornal Notícias, de 9-2-1971

Em 1935, realiza-se o "Cruzeiro Aéreo às Colónias", que foi o maior voo de formação levado a efeito por portugueses. A esquadrilha partiu de Lisboa a 14 de Dezembro de 1935, sob o comando do coronel Cifka Duarte e era composta por três patrulhas de aviões militares, de que faziam parte o Tenente-Coronel Ribeiro da Fonseca, Majores Pinheiro Correia e Pinho da Cunha, Capitães Viegas, Amado da Cunha, Cardoso Baltazar, Tártaro, Pimenta, Tenentes Humberto da Cruz e Manuel Gouveia e os mecânicos Dinis, Pedro, Gomes, Aníbal, Abílio Santos, Ramos e Simões.
A rota seguida fora: Lisboa - Guiné - Lago Tchad - Leopoldeville - Luanda - Elizabethville - Tete - Beira e Lourenço Marques, onde a esquadrilha chegou a 29 de Janeiro de 1936.
Voltaram pelo ar, regressando a Lisboa, por os outros elementos do cruzeiro se encontrarem doentes, apenas o major Pinho da Cunha, capitães Cardoso e Baltazar e mecânicos Simões, Ramos e Dinis.
No ano seguinte, 1937, o Major Pinho da Cunha, a pedido do Diplomata Dr. Ferreira da Fonseca, que não tinha outro meio de transporte para se avistar, a tempo, com o estadista Sul-Africano Oswald Pirrow, para uma importantíssima entrevista, realizou a viagem Lourenço Marques / Luanda e volta, ou seja, mais de 800 quilómetros de 24 horas. O Trajecto foi Lourenço Marques - Salisbury -Lusaka - Elizabethville - Vila Luso - Luanda - Victoria Falls - Bulawayo - Pietersburg

FONTE:
Historia dos Caminhos de Ferro de Moçambique
Alfredo Pereira Lima - 1971
REALIZADO POR :
JOSÉ MARIA MESQUITELA


7 comentários:

Henrique Santos disse...

Que belo blog! Que maravilha! no local mais indicado deixei esta msg que a seguir transcrevo. Vou alertar a malta do Aeroclube para esta preciosidade, dás-me licença?

Obrigada pelas fotos, minha e desse super comandante Rui Monteiro meu distintíssimo colega.
Uma novidade a minha irmã Graciete, foi a primeira madrinha do Aeroclube de Moçambique! E, esta, hein? Vou vêr se consigo scanear essas fotos...
Este é agora um local preferido, BOA!
Ricky

Anónimo disse...

Belo blogg,que para mim tem especial sentimento,pois aqui fala-se do começo da DETA e tive o previlégio de ser dos ultimos pilotos dessa que foi uma grande companhia.

Luisa Hingá disse...

E eu de certeza que o conheço. Trabalhei no Despacho da Aeronáutica Civil, em Lm,até 31.12.1974 e quando iam para bordo, ou vinham passavam à nossa porta.
Não quer colaborar?

Anónimo disse...

Para mim é absolutamente fantástico ter acesso a estes testemunhos sobre os primórdios da aviação em Moçambique!!Sou um moçambicano entusiasta nesta matéria e sou finalista do curso de Mestrado em Engenharia Aeronáutica na Covilhã, daí o meu interesse em "aeroassuntos".O meu "khanimambo" por contribuir para que se saiba qual foi a génese da aviação moçambicana.

Maria disse...

Obrigada pelo vosso trabalho. Quem, como eu, tem o "bichinho" da aviação no sangue, compreende e valoriza todo o empenho e cuidado aqui patente. Trabalhei na DETA e LAM e estou a escrever as minhas memórias. Gostaria de enriquecer o meu trabalho com informação geral sobre a aviação em Moçambique e precisava de dados sobre os primeiros campos de aviação na Matola e na Carreira de Tiro. Neste blog encontrei apenas uma fotografia. Alguém me pode ajudar?

Maria disse...

Parabéns pelo blog. Quem tem o "bichinho" da aviação no sangue, como eu, só pode valorizar o empenho e carinho que nele colocam. Trabalhei na DETA e LAM e estou a escrever as minhas memórias, mas gostaria de enriquecer o "trabalho" com dados sobre os primeiros campos de aviação de LM, na Matola e Carreira de Tiro. Aqui só encontrei uma fotografia. Alguém me ajuda?

José Vilhena disse...

Cara Maria
Muito pouco temos sobre o campo da Carreira de Tiro na Polana, já que da Matola julgo que nunca terá existido mais do que um simples terreno meio lavrado onde alguns aviões aterraram...
Boa sorte para o livro sobre as suas memórias que de certo nos relembrarão os bons velhos tempos da DETA.